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www.uniaonet.com/joseferreiralisboa.htm Pr_José Ferreira _ Pastor Evangélico, trabalho como missionário, gosto de trabalhar em áreas isoladas, fiz curso de missões em Londres , servi cinco anos na Africa, fiz trabalhos evangelisticos no Senegal, Gambia e Cabo Verde, servi tres vezes em Portugal, 98 99 Arco de Vadevez norte, 2005 Lisboa, ultimamente em Odivelas. Sou escritor do Livro Portas de Bronze.(relato missionário da obra de Deus na Africa.) Em Cristo Jesus, por um mundo perdidoe sem Deus.


Índice :

01. ) O Encontro com um Rei
02. ) O REI SE APRESENTA
03. ) MULHERES ESCRAVAS _ 18/02/2010

04. ) Núpis, Nunca Mais
05. ) AS ABOMINAÇÕES DOS GENTÍOS
06. ) OS DADOS SAGRADOS
07. ) PLANTAÇÃO DE IGREJA BAFATÁ- G.BISSAU- DECADA DE 80 _ 26/02
08. ) “ENCONTRO DE MISSIONÁRIOS, 01/03
09. ) O grande desafio _ 04/03/2010


 
01. ) O Encontro com um Rei _ 18/02/2010
 
“Os povos têm costumes diferentes”.
 
     Lembro-me de um homem que conheci na capital da Guiné Bissau. Ele era natural da Ilha de Pecixe. Possuía trinta e três esposas, fora as amantes. Naquele país o poder de um homem é medido pelo número de esposas que possui. Em 1987 quando morava em Bafatá tomei uma decisão de entrevistar aquele homem.
Peguei meu gravador. Fui procurá-lo, precisava registrar os detalhes.
 
     As viagens dentro do território guineense eram muito difíceis. Dificílima até, dependendo para aonde se ia quase impossível.
     Muito das vezes o viajante era compelido a jogar-se ao solo, vencido pela exaustão. Se a provisão de alimento e água não fosse suficiente, com certeza teria que provar um cardápio bem diferente do costumeiro.
     Quando decidi deixar Bafatá rumo a Ilha de Pecixe, do oeste para o leste do país, já sabia que seria muito difícil. Alguns negativistas chegaram a prever que eu seria devorado pelos enormes crocodilos. Outros relatavam casos de canoas viradas por hipopótamos, justamente no lugar que eu teria que passar.
     O desejo de conhecer mais a cerca daquele homem interessante, era tão grande que me cegou para as dificuldades que poderia enfrentar. Aliás, era a primeira vez que eu iria entrevistar um rei. Valeria a pena, sim. Quantas vezes eu viajei por
motivos menos importante e corri o risco pelo caminho até alcançar o objetivo.
     A primeira etapa, de Bafatá a Bissau, a capital do Guiné, fiz de moto. Tudo correu bem, apesar da carga que me obrigava a parar várias vezes para ajustá-la. Sempre tinha que levar um galão extra de gasolina, outro de água além da barraca, colchonete, panelas, alimentos, roupas, remédios, etc.
     Uma vez em Bissau fui até ao Porto das Canoas sondar a
possibilidade de alugar uma para seguir até a Ilha de Pecixe. Encontrei um pequeno grupo de homens, talvez uns oito, e apenas três canoas atracadas. Conversando com alguns sobre a viagem, dois deles se mostraram interessados. Disseram-me que a canoa deles era muito boa, que tinham experiência até em mar alto, e que o trajeto era bem conhecido.
     Apesar da crise que o país enfrentava com a falta de combustível, eles estavam dispostos a remar. Mesmo assim afirmavam que a viagem seria rápida. Combinamos então a saída para o dia seguinte, às 5 horas, aproveitando a vazante da maré.
     Quando ia me retirando um deles disse-me que eu teria que pagar metade do combinado, caso contrário ele alugaria a canoa para outro que aparecesse.
     E agora, correria o risco de ser enganado ou, de perder a viagem tão esperada? Afinal ali somente havia três canoas e eles que se dispuseram em ir até a Ilha de
Pecixe. Paguei então e fui para o local onde estava hospedado.
     Passei a noite quase toda acordada pensando naquela viagem. No outro dia um amigo holandês me levou em seu Land Rover até próximo ao Porto das Canoas. Deixou-me ali e retornou para sua casa enquanto eu caminhava até o cais. Ao chegar fiquei espantado ao ver uma multidão de mais de seiscentas pessoas e quase cento cinqüenta canoas.
     No escuro os homens pareciam todos iguais e as canoas tinham o mesmo formato. O povo andava de um lado para outro, uns puxando cabritos pela corda, outros com porcos nos braços, frangos amarrados pelas pernas pendurados em varas.
As mulheres conduziam enormes cestas na cabeça e crianças amarradas às costas.
Já estava quase desistindo quando ouço alguém chamar.
– Tuga, tuga, vamos que a maré está baixando. A palavra tuga se traduz por colonizador, mas eles a usam para identificar o branco.
     Apesar de tudo parecer igual para mim, eu era completamente diferente para todos. Iniciamos a viagem. As primeiras horas da manhã foram muito agradáveis. Assistimos ao nascer do Sol. Foi um espetáculo deslumbrante. Assim que o Sol despontou, por alguns minutos, as águas do mar se coloriram de um vermelho sanguíneo. Soprava uma brisa suave. As gaivotas sobrevoavam a canoa enquanto os
golfinhos a acompanhavam fazendo seus malabarismos. O capitão e seu ajudante que diziam se chamar Paxana e Propana era filhos do mesmo pai, porém de mães diferentes.
     Eles me contaram cada história incrível de quando estiveram na guerra contra os portugueses. Havia na canoa mais quatro rapazes contratados para ajudar no remo. O esforço foi tão grande que sobrou para mim. Tive que remar também. A viagem durou dezesseis horas. O calor, de quarenta a quarenta e cinco graus centígrados, ficou quase insuportável e a umidade do ar chegou aos cem por cento. Fizemos apenas duas paradas.
     A primeira parada foi no porto de uma ilhota onde havia algumas famílias de pescadores. Todos estavam completamente nus. Alguns consertavam redes enquanto outros fabricavam canoas de tronco. As moças mexiam nas panelas de barro sobre uma trempe de pedras. As mulheres pilavam grãos.
     Uma criança defecou bem próxima a uma mulher que cozinhava algo em seu “fogão” de três pedras. Quando o menino se levantou a mulher, com uma cuia, jogou água em sua mão passando-a no bumbum da criança. Em seguida voltou a mexer a panela com uma colher de pau.
     Os companheiros de viagem se embrenharam no mato a procura de vinho para beber. Eu achei uma sombra de um frondoso cajueiro. Quando pensei em descansar ali, um bando de crianças se aproximou, olhando-me atentamente.
Tentei um diálogo, porém sem sucesso. Como elas me olhavam o tempo todo sem falar nada, tentei oferecer um pacotinho de balas que se encontrava em minha bolsa. Ao abaixar para pegar as balas, elas se assustaram, saindo correndo, chorando e
gritando.A única que ficou fez xixi ali mesmo e seus joelhos batiam
um no outro.
     Quando prosseguimos a viagem contei aos companheiros o que tinha acontecido. Um deles esclareceu o fato. Era costume entre certas mães dizer aos filhos “se você não fizer isto, o branco vem te pegar”.
      Foram mais quatro horas de suplício sob um Sol causticante até a próxima parada. Um porto infestado de mosquitos ávidos por sangue. Mal colocamos os pés em terra já nos atacavam. Tínhamos que estar o tempo todo batendo um pano no corpo. Notei que alguns moradores daquele lugar pareciam fantasiados. Fiquei sabendo depois que era apenas uma proteção. Eles fazem um “caldo” com o estrume do gado e o aplicam sobre a pele. Seco, ele forma uma crosta que impede a picada dos mosquitos.
     Naquele lugar fomos bem recebidos pelos moradores. Um senhor nos convidou para entrar em sua casa e nos apresentou sua família começando pelas esposas. Uma senhora que aparentava
ter cinqüenta anos era a sua primeira mulher e dona da casa.
     Depois veio a segunda, a terceira, quarta e por último uma menina
com onze ou doze anos. Esta seria a quinta esposa. Depois foi a vez dos filhos. Ele dizia “este eu pari com aquela...este outro eu pari com esta...” e assim até apresentar todos os seus rebentos.
     Ofereceram-nos água fresca. Os homens travaram uma conversa animada em uma língua que eu não entendia nada do que falavam. Fiquei, só, na área da casa, sentado em uma esteira tentando descansar.
     Uma menina, cerca de oito anos, chegou perto de mim e estava a fim de conversar. Ela tinha um penteado, com várias trancinhas, muito bem trabalhado.
     Eles observam atentamente os cabelos lisos que são uma grande novidade. Existem pessoas que nunca viram alguém de cabelos lisos. Como os macacos têm os pelos lisos, para eles nós parecemos macacos. Eu disse a ela: bo sedu badjudaziña bunitu (você é uma mocinha bonita). Ela respondeu: bo sedu fio (você é feio). Indaguei: Pabia di ke (porquê?). A resposta: bo sedu suma sancho (você parece
um macaco). Ela tinha certa razão.
 
     Na terceira etapa da nossa jornada, de fato passamos pelos bandos de crocodilos. Eles pareciam troncos de árvores flutuando sobre a água. Mais adiante uma preguiçosa família de hipopótamos se refrescava deixando apenas o nariz e o fio do lombo fora d´água. Eu mesmo não os teria notado se não fosse alguém da canoa que gritava... “Pis kabalo, pis kabalo! (peixe cavalo, peixe
cavalo)”, forma como eles chamam o hipopótamo.
Finalmente chegamos a um porto. Fui informado que estávamos na Ilha de Pecixe. Eram quase 22 horas. Para chegarmos ao vilarejo Fante ainda caminhamos vários quilômetros. Acampamos e ao amanhecer fiquei sabendo que poderia ter feito a viagem por terra, muito mais curta e menos cansativa, pois a ilha de Pexixe ficava não muito distante do continente.
     Cheguei afinal na casa da pessoa quem eu procurava. Fui muito bem recebido e fiquei hospedado ali. Ele se dispôs a contar um pouquinho de sua história.
 
 
 
02. ) O REI SE APRESENTA
     Meu nome é Okamte Zabane. Sou natural da Ilha de Pecixe, de família real. Herda-se a “reinança” através da linhagem materna.
     Em 19 de outubro de 1955, com apenas 21 anos de idade e sem muita experiência, eu fui consagrado Rei da Ilha de Pecixe. O Estado me concedeu um conselheiro. Seu nome era Manoel da Silva que reuniu certos homens e decidiu que deveria construir uma casa nova com todo o conforto para o regúlo Okamte pudesse reinar com toda liberdade. Régulo é o nome que dão ao rei de uma pequena nação.
     Não me foi permitido ocupar a antiga casa real. Segundo o conselheiro,
a casa estava velha. Eu teria a minha própria casa. Durante todo o tempo da construção também fui proibido de ver o que estava acontecendo.
     Somente depois de pronta tive a permissão de entrar nela. Na sua inauguração, seguida da posse, houve seis dias e seis noites de festa. Havia muita carne, bastante vinho, música e danças.
     Comecei então a reinar. Meu poder era absoluto. Eu mesmo compunha
as leis que regia aquele povo. Claro que as compunha ,conforme bem me parecia,
facilitando sempre para o lado da casa real. Escolhi a dedo todos os meus ministros, homens feiticeiros de forma comprovada. O critério usado na avaliação e escolha foi observando o grau de maldade de cada um,inclusive o requinte de crueldade usado em suas obras de feitiçarias.
     Foram convocados os soldados para a guarda da Ilha. A guarda pessoal do régulo foi composta de jovens denominados “rapazes do régulo”. Eles estariam em toda a parte onde quer que o régulo se encontrasse. Fora e dentro da casa, garantindo assim a segurança pessoal, para que o régulo não fosse molestado.
     Os despenseiros também foram chamados. Homens que tinham a obrigação de prover toda sorte de alimentos para a despensa real. Tinham o poder para tomar animais onde quer que eles se encontrassem a fim de não faltar a melhor carne na mesa abastada do régulo. Além do vinho nacional que entrava em forma de tributo, os despenseiros mandavam vir da Europa uísque e conhaque da melhor qualidade.
     Entre os anos de 1955 a 1966 eu tomei trinta e três mulheres para esposas, além de inúmeras amantes, pois tinha todas as mulheres que eu queria. Era só mandar buscar que elas tinham que vir. Sem contar as jovens que eram levadas pelos próprios pais, que escolhiam entre as mais belas as apresentavam à porta da casa real, onde rogavam para que as aceitassem.
     Foi construído um pavilhão somente para as mulheres. A cada cinco
compartimentos tinha seu próprio quintal. Havia até uma maternidade
para a casa real. Constantemente havia mulheres gestantes as quais eram bem tratadas
até a hora do parto. Depois a criança era levada pelos feiticeiros que lhe dariam cuidados especiais, principalmente se fosse do sexo masculino e somente voltava à mãe para a amamentação.
     Nenhuma forma de assistência pós-parto era dada para as mulheres,
nem alimentá-las era permitido. Ficavam à mercê da própria sorte. Se não fosse a compaixão de seus familiares em levar-lhes algo para comer, pereceriam de fome, com certeza.
     Tudo estava em minhas mãos. Cada cerimônia eu decidia tudo. Saíamos para algum “choro” importante (velório ou festa de aniversário de morte de alguém), tomávamos conta da estrada. Todas as esposas, alguns filhos, a guarda pessoal, alguns soldados, os ministros... Enfim, uma multidão.
     Quanto ao castigo, muitas vezes eu fazia questão de aplicar pessoalmente,
para ter certeza que o infeliz recebeu tudo o que ele merecia. Por vários anos em que eu vivia em toda aquela glória, não conheci ninguém mais poderoso que eu. Sim, eu me sentia o próprio Deus. Nos julgamentos de questões entre o povo, eu dava razão a quem queria, mesmo sabendo que a pessoa estava errada. O que estava certo tinha que sofrer o dano.
     Na década de 60 com o movimento para libertação da Guiné do
colonialismo português, por motivos políticos, fui preso por um tempo. Minha
vida começou a mudar completamente.
     Eu não sentia paz. Minha consciência pesava dia e noite. Lembrava-
me de quanto sofrimento eu havia causado para aquelas mulheres.
     Quantas mãos por mim arrebentadas pelas palmatórias, dos animais
arrebatados de seus donos, muitas vezes eram o único animal que possuía, ainda assim, sem piedade, eu os tirava para não faltar carne na minha mesa.
     Lembrava-me das feitiçarias. O quanto delas praticadas ao longo
dos anos no afã de conseguir tudo o que eu desejava. No ano de 1966 eu tive um encontro real com Jesus Cristo, o verdadeiro
Rei. Rendi-me totalmente à sua vontade. Ele perdoou todo o meu pecado Transformou a minha vida. Libertou-me daquela escravidão em que eu vivia. Somente, então, conheci a verdadeira paz.
     Como o meu reinado decadente já estava no final, não me restava
mais poder algum. Minha glória terrena havia passado. Minhas esposas aproveitaram
a ocasião e me abandonaram uma a uma. Restou-me apenas uma que teve uma experiência maravilhosa com Deus. Perdoou-me e ficou ao meu lado.
     Hoje eu não tenho nada além deste casarão vazio e escuro. Mas
tenho Jesus em minha vida. Gozo a verdadeira paz. Deito e durmo tranqüilo. Tenho certeza que um dia terei a verdadeira glória com o Senhor.
 

MISSIONÁRIO JOSÉ FERREIRA - GUINÉ BISSAU- BAFATÁ DECADA DE 80

OKANTE ZABANE-RÉGULO DE PEXIXE

03. ) MULHERES ESCRAVAS .
       
São sete horas da manhã, hoje é uma sexta-feira. Já estamos em novembro de 87, no final da estação chuvosa. Aqui na Guiné Bissau este cantinho gostoso da África. A chuva cai quase todos os dias de maio a outubro, produzindo um enorme lençol verde em toda a savana, ornamentando-a com flores silvestres e belas aves exóticas.
A região de Bafatá é "Chão" das tribos muçulmanas Fulas e Mandingas. Na nossa rua o movimento é incomum desde a madrugada, deixa antever que algo está para acontecer. Talvez uma cerimônia importante seguida de festa.
As mulheres africanas estão chegando a todo o momento, exibindo seus "panos novos" e os cabelos tecidos formando penteados complicados. As bailarinas trazem chocalhos em volta da cintura e dos tornozelos. Os jovens e senhores chegam com seus tambores.
Desde a madrugada ouvíamos o barulho dos pilões. São as mulheres preparando o arroz, a  mancarra e o "xebem".
Elas pilam em três ou quatro para cada pilão, produzindo um som cujo arranjo musical foi composto, segundo eles, pelos deuses africanos.
Os movimentos que uma mulher faz ao levantar e baixar a mó do pilão leva o seu corpo a obedecer ao compasso da música, produzindo assim uma dança perfeita. A mulher africana não necessita aprender a dançar. Ela já nasce sabendo.
Traz esse conhecimento desde a sua infância. Muitas e muitas vezes ainda no ventre da mãe ou amarrada às suas costas ela dançou ou ouviu aquela música.
Está chegando a nossa casa o jovem Kebá, meu professor da língua Fula. Kebá é um moço talentoso. Possui grande conhecimento nos usos e costumes de sua tribo. É muçulmano praticante e professor da Língua Portuguesa na escola da cidade.
Com muito jeito - para Kebá não notar a minha curiosidade - lhe faço uma pergunta objetiva.
- Então, o quê está acontecendo na casa do vizinho?
Ele me responde:
- Não é nada. É apenas a festa de Mariama!
De início pensei logo que se tratava de aniversário. Mariama tinha apenas seis anos,era uma menina esperta e sadia. Quantas vezes ela ia até nosso portão e ficava conversando conosco, uma criança normal que gostava de brincar como as outras crianças e fazer de tudo relativo à sua idade.
Alguém já havia dito à ela naquele dia: Esta festa toda é para você. A pessoa mais importante, hoje, é você. Ela corria de um lado para o outro trajando seu vestido novo, meio sem jeito. Mariama sempre usava apenas trapos imundos, revelando a pobreza em que vivia.
No terreiro, espalhadas pelo chão, esteiras de juncos, várias cabaças cortadas ao meio servindo de tigelas continham certos alimentos, além de garrafões de vinho de caju. Enfim a "mesa" do banquete estava posta.
De repente ouvem-se gritos estridentes de dor profunda. Uma criança gritava e chorava ao mesmo tempo. Então seus gritos foram abafados pelo rufar dos tambores e o chocalhar das danças. Era o ponto culminante da cerimônia.
Daí em diante ouvia-se os adultos conversando e rindo, demonstrando satisfação e alegria.
O que estaria de fato acontecendo ali? Estaria aquela gente fazendo algum sacrifício humano? Tínhamos ouvido histórias de sacrifícios humanos seguidos de canibalismo entre as tribos africanas. No entanto, Kebá que percebia a nossa inquietação, disse:
- Foi apenas a Mariama que lhe botaram o 'fanado. 'Fanado? Sim. O que eles chamam de Pequeno Fanado nada  mais é que a circuncisão feminina, algo que acontece com todas as crianças muçulmanas do sexo feminino entre quatro e seis anos de idade. Como é feito isto? Pergunto. Uma "mulher grande" - senhora de idade, com muita responsabilidade e experiência, lanceta com um bisturi de fabricação caseira, o clitóris da criança.
A finalidade principal de se botar o fanado na menina é para que elas não venham a ter prazer sexual, facilitando assim a submissão total ao homem, no caso, o seu marido.
O dever da mulher em certas tribos africanas é satisfazer sexualmente o seu marido obedecer-lhe em tudo, cuidar do campo de arroz, da horta, da casa, etc. Dar-lhe bastantes filhos e criá-los.
As mulheres ao casar, seus bens passam a pertencer ao marido, tendo posse somente de seus colares e brincos feitos de conchas marinhas, além do "pano" que envolve seus corpos da cintura para baixo. Da cintura para cima não é precisamente necessário usar roupa alguma.
Os seios à mostra servem para facilitar a avaliação masculina.
A menina africana entre dez e onze anos, quando começa a despontar seus seios sabe-se que já está pronta para casar. O homem a quem ela foi prometida, procura a família dela para providenciar a cerimônia de casamento. Por outro ângulo, os seios volumosos demonstrarão capacidade para amamentar os filhos, despertando interesse em homens para tomá-la por esposa, caso não seja prometida.
O Grande Fanado
Quando a jovem africana das tribos muçulmanas atinge de onze a dezesseis anos é levado ao Grande Fanado. Um grupo de menina vai para a selva, num lugar secreto previamente escolhido por adultos, longe dos olhares curiosos dos homens e de algumas mulheres que de algum modo escaparam do Pequeno Fanado.
É possível circuncidar jovens na idade adulta. Se esta se apresentar para o Grande Fanado e comprovado através de exame prévio que não possui a cicatriz no clitóris, então ela é circuncidada ali mesmo, na hora.
Ao chegarem à clareira sagrada para as cerimônias do Grande Fanado, as jovens têm que se despir completamente. Suas roupas são bem guardadas, pois são impedidas de sair dali antes do término do evento.
Este segundo e último fanado demora vários dias para ser realizado. Durante todo o tempo as candidatas permanecem nuas. Uma vez ali não há lugar para arrependimento.
Ali elas aprendem como  se portar sexual com o futuro marido, como obedecê-lo em tudo, agradando-o da melhor maneira, e, muitos conselhos para fazer delas esposas ideais.
Tudo o que fazem ali tem que ser dentro de um segredo absoluto. Não se comenta nada com ninguém, a não ser com outra mulher comprovadamente circuncidada.
Antes de saírem dali são feitos certos juramentos de que tudo o que aconteceu não vai cair nos ouvidos de homens ou mulheres não circuncidadas.
Para um estrangeiro obter certas informações fica mais fácil usando o sistema do "soko di bas". Esta expressão da língua crioula quer dizer soco em baixo que nada mais é do que alguém com o punho fechado, levando-o rapidamente em direção ao baixo ventre de outra pessoa, que para se defender segura de imediato aquela mão fechada que logo se abre passando assim o dinheiro da propina.
Com um "soko di bas" de dez dólares é possível conseguir boas fotos, filmagens, entrevistas e até ouvir esses tão guardados segredos.
Somente depois de terminado todo o ensinamento é que as meninas recebem suas roupas, panos para a cabeça, miçangas de conchas, provas de que já participaram do Grande Fanado.
Voltam para suas casas, festejam com seus familiares, se sentem importantes e superiores perante aquelas que ainda não foram ao Grande Fanado.
A aula de Kebá transformou-se em exposição da cultura e costumes de sua tribo. Ele se foi. Seguiu seu caminho. 
Eu fiquei só a imaginar. Aquela inocente criança num quarto escuro, sozinha, sofrendo grande dor. Um pano apertado entre as pernas para não sangrar até a morte, com medo, sem nada entender. Enquanto isso, no terreiro, seu povo dançando, comendo e bebendo, cantando feliz, certo de ter feito e participado de algo bom e correto.
O incrível é pensar que em pleno século XXI ainda existe barbaridades como estas, cometidas contra mulheres e crianças, e o mundo evoluído em que vivemos parece contemplar tudo em silêncio porem sem saber como fazer para reverter este triste quadro que ainda perdura


04. ) Núpis, Nunca Mais
Certo dia eu voltava de uma viagem a Ziguinchor, via São
Domingos, passando por Ingoré, rumando para São Vicente onde
faria a travessia do grande Rio Cacheu. Ali tinha que usar uma
balsa para assim ganhar o caminho de volta a Bafatá.
Ziguinchor é a segunda cidade mais importante do Senegal,
país colonizado pelos franceses. Esta cidade fica na região do
Casamance, ao sul do país. Além da fronteira, a primeira cidade
guineense é São Domingos.
A cada seis semanas íamos a Ziguinchor, pois tínhamos
duas filhas, a Márcia e a Luciane que estudavam lá em regime
interno na Bourofaye Cristian School. Além de passar o fim-desemana
com as filhas, ainda nos províamos de certos alimentos
não encontrados na Guiné.
Naquele dia eu vinha só, dirigindo o Volvo da missão em
que trabalhava. Aquele carro havia sido doado pelo Exército
da Suécia. Foi de grande ajuda para todos, pois possuía quatro
pneus lameiros, tração nas quatro rodas e motor a diesel. Era
um ótimo carro para aquelas estradas, péssimas, principalmente
quando elas terminavam. Abria seu próprio caminho no mato
e seguia em frente.
Quando sai de Ingoré rumo ao porto da balsa, próximo a
um vilarejo de nome Antotinha, de repente surge no meio da
estrada saindo do mato uma jovem senhora que balançando os
braços desesperada fazia sinal para que parasse.
Como ela não tinha nenhuma carga, pois é quase impossível
imaginar uma mulher africana sem uma carga; pensei logo
que se tratava de um acidente, um filho doente talvez. Ela se
aproximou rogando encarecidamente que a levasse para longe
dali. Aí eu fiquei encabulado. Achei que ela havia matado alguém
e por isso precisava fugir dali.
Não querendo me comprometer, pedi-lhe que me contasse
a verdade, o que ela tinha feito de tão grave para fugir assim. Ela
me disse que nada havia feito, mas que seu homem a procurava
para matá-la. Ele não sabia onde ela estava, porém mais cedo ou
mais tarde ele a descobriria, daí a necessidade de ganhar tempo,
fugir dali, informou a tal mulher. Deixei que ela entrasse no carro
como pensei em deixá-la no porto da balsa que estava bem próximo.
Ali ela estaria segura, pois havia sempre muita gente.
Como ficou sabendo que eu era de Bafatá, a mulher disse
que tinha alguns conhecidos ali e que há muito não os via. Pediu-me
que a levasse até lá, onde começaria uma nova vida e dificilmente
seria encontrada. Concordei e no caminho me contou
detalhadamente a sua história.
Ela se chamava Segunda (certamente por ter nascido numa
segunda-feira). Tinha vinte e dois anos. Não tinha filhos e era da
raça Balantas. Viveu na região de São Vicente cerca de doze anos
com um grupo de Balantas que habitava ali.
Aos dez anos fugiu da sua terra para não casar com o homem
a qual havia sido prometida.
Na tribo Balantas, dizia ela, a criança do sexo feminino
assim que nasce já é dada em casamento. Segundo sua mãe, quando
estava grávida, principalmente depois do oitavo mês, um homem
amigo de seu pai, vivia rondando por ali sempre em volta
da casa puxando assunto para demorar um pouco mais.
Esse homem tinha na época cinqüenta e oito anos, casado
com quatro mulheres e um bando de filhos. No dia que sua mãe
entrou em trabalho de parto, o homem estava ali por perto. Quando
nasceu a criança e a parteira anunciou ser uma menina, o homem
gritou na área da casa "É minha prometida, é minha prometida". O
pai aceitou, é claro. Além de ser um costume da tribo, é apenas
uma menina e menina não tem valor algum. O quanto antes sair
de casa melhor. Uma boca a menos para comer.
Quando ainda criança, Segunda não entendia porque um
certo velhote vivia visitando a família. Entre tantas crianças ela
era a única que ele achava de fazer gracinhas. Somente bem mais
tarde que veio, a saber, que ele era seu futuro esposo. E que os
feixes de lenha que às vezes ele deixava no quintal, a raiz da
mandioca trazida por ele e o garrafão de vinho, era o dote que ele
pagava ao pai para tê-la como esposa.
O vinho lembra-se, ele mesmo levava e bebia tudo. Sentado
com seu pai conversando e bebendo. Tinha dia que ele
bebia tanto que não conseguia levantar-se. Era necessário que
os irmãos de seu pai o colocasse em pé, segurando-o até suas
pernas firmarem.
Depois o deixava e com um leve empurrãozinho ele começava
a caminhar até chegar em sua casa.
Segunda jamais se esqueceu de um cachimbo fedorento
que ele usava. Quando ela sentia o cheiro daquele "canhoto" -
como eles chamam o cachimbo -, tinha vontade de sumir dali.
Quando completou dez anos as esposas daquele homem a
procuraram. Queriam instruí-la acerca do futuro casamento. Possivelmente
dali dois anos. Ela estaria com doze anos e ele com
setenta. Falaram da cerimônia do casamento e que antes fariam
um teste para saber se ela ainda era virgem ou não. Usariam duas
cabras que permaneceriam amarradas. Uma representava a virgindade,
a outra não. A que urinasse primeiro revelaria o resultado.
E somente assim prosseguiriam com o ritual.
Enquanto Segunda me contava isso e sem prestar-lhe mui
ta atenção, lembrei-me de um fato curioso ocorrido nas Ilhas dos
Bijagós.
Uma vez estava naquela Ilha e conversando com um amigo
bijagós, lhe fiz algumas perguntas sobre sua cultura. Ele me
disse que não sabia ao certo, mas que conhecia alguém muito
entendido, que certamente me daria às explicações.
Era um senhor de idade que morava bem perto de onde
estávamos. Meu amigo disse-me:
- Vamos lá agora em sua casa, pois ele deve estar só. Vi
toda sua família descer para a roça de arroz. Assim será mais fácil
para ele, dar as explicações.
Chegamos a casa daquele senhor. Como meu amigo era
íntimo da família, foi logo entrando sem anunciar, e entrei atrás
dele. Quando chegamos à sala ele estava sentado em um
banquinho de três pernas. No meio de suas coxas estava presa
uma menina, talvez com menos de quinze anos com seu rosto
encostado no chão e o bumbum para cima. Ele tinha em sua mão
um ovo de galinha que tentava introduzir na vagina da jovem.
Assim que chegamos, ele a soltou. Ela desapareceu pela
porta dos fundos. Ele explicou que estava fazendo o teste da
virgindade. Do resultado do teste dependeria o seu casamento
ou não com ela.
Voltando à história de Segunda. Depois de tudo que viu e
ouviu a seu respeito tomou uma decisão. Fugiu de casa sozinha e
foi morar na região de São Vicente com aquele grupo de Balantas.
Três anos mais tarde ela ficou sabendo, através de amigos,
que aquele senhor à quem estava prometida, falecera. Continuou
vivendo ali como agregada na casa de uma grande família. Fez
muitas amizades. Não tinha o porquê se mudar dali onde ela fora
tão bem recebida.
Oito anos depois apareceu na vila um forasteiro que iria
mudar totalmente sua vida.
"Homem de corpo bem feito, no vigor de sua juventude,
distribuindo largos sorrisos exibindo sua dentição branca e perfeita.
Aquele era o homem de minha vida", disse Segunda.
Caída de amor não tinha olhos para mais ninguém. Um
sentimento intenso se apoderou dela, mobilizando todas as suas
energias e faculdades pessoais. Aquela grande paixão estabeleceu
prioridades absolutas na vida e no comportamento de Segunda,
ao ponto dela se sentir materialmente inclinada a viver e
a agir em função daquele homem. Chegou a deixar de comer.
Seus amigos vendo a loucura que Segunda estava prestes a
cometer, lhe aconselhavam: "Segunda, tome cuidado. Esse homem não
é Balantas, é da raça Felupes. Esta gente não presta. Você irá sofrer muito
se ficar com ele". Mas, cega de amor não via nada além de felicidades.
Chegava a pensar que seus amigos sentiam inveja dela e por
isso queriam atrapalhar.
Enfim, já estava perdida. Voltar atrás estava fora de cogitação.
Acabou ajuntando-se com aquele homem e foi-lhe sua
esposa.
Passou duas semanas que lhe pareceram uma eternidade
de gozo e felicidade.
Pois, aquele homem com seus carinhos e bajulações a levava
à glória e ela dizia consigo mesmo, "Realmente sou feliz. Este
é de fato o homem da minha vida".
De repente ele se dirigiu a ela e disse: "Segunda, gostaria
imensamente que você fosse comigo até a minha tabanka, conhecer o meu
povo". Ela respondeu: "Eu irei. É justo que eu vá, afinal é sua família.
Estamos de favor aqui, quem sabe lá construiremos nossa casa e criaremos
nossos filhos...".
Eles se despediram dos amigos, e empreenderam então a
longa viagem. Apesar de ser perto geograficamente, com a dificuldade
de transporte e os caminhos precários o casal demorou
quase um mês para chegar ao destino.
De Apilho, um vilarejo às margens do Rio Cacheu, seguiram
a pé pela trilha dentro da floresta até chegarem a uma tabanka
por nome Núpis.
Lá numa grande clareira estavam dispostas duas fileiras de
palhoças, habitações construídas com adobe e coberta de palha.
Uma trilha tortuosa levava até um trapiche no Rio Cacheu, feito
de sibi, uma palmeira resistente, a mais de quarenta anos, onde
de vez em quando algum barco se aventurava atracar à procura
de coco, ovos, óleo de palma, etc.
Segunda logo percebeu que a recepção não foi nada calorosa.
O povo a olhava de soslaio, dizia frases curtas em uma
língua desconhecida e apontava para ela "esticando o beiço" em
sua direção. Até o homem que ela tanto amava e que ele mesmo
muitas vezes lhe havia jurado amor eterno, agora se mostrava
hostil, de pouca conversa, distante, evitando-a ao máximo. Tudo
começou após uma pequena reunião que aconteceu entre os homens
daquela tabanka, assim que chegaram ali.
À noite foi realizada uma grande cerimônia que entre o
sacrifício e todo o ritual demorou várias horas. Porém, Segunda
não foi convidada. Aliás, havia sido proibida de participar.
Não devia nem sair da casa naquela noite, lhe advertira o
marido.
Ao redor de uma fogueira, única fonte de luz em meio daquele
mundo de trevas, o povo dançava ao som dos tambores.
Sozinha naquele barraco escuro, deitada sobre uma esteira,
Segunda meditava. Como era feliz em São Vicente. Como
havia sido estúpida não ouvindo os conselhos dos amigos.
Chegou a lembrar de sua infância na casa dos pais. Sentiu
uma ponta de saudade. Se fosse possível trocaria de situação. Ali
estava acontecendo algo muito estranho que ela não conseguia
entender e ninguém lhe dava explicações.
No dia seguinte seu marido lhe disse: "Vá à casa de Mossó e
traga de lá um pedaço de carne e prepare o nosso almoço". Ela saiu em
direção à casa de Mossó, que ficava um pouco mais distante das
demais. Ao chegar lá observou que sobre um jirau de bambu estava
certa quantidade de carne coberta com uma esteira. Lá fora
apenas duas crianças entre oito e dez anos, com paus nas mãos
estavam a enxotar os urubus que insistiam em pousar no quintal
em busca de alimentos.
Um pequeno balaio, de tampa, chamou a atenção de Segunda,
pelo fato de uma quantidade enorme de moscas voava em sua
volta. Para satisfazer sua curiosidade ela se aproximou do balaio e
ergueu a tampa para olhar o que continha em seu interior.
Por alguns minutos ela ficou petrificada, parecia que o sangue
gelava em suas veias.
Dentro daquele balaio estava a cabeça de um homem. Segunda
não teve mais dúvidas.
Aquela carne era humana. Aquele povo era canibal. O sacrifício
da noite anterior, a festa, a proibição de ela sair de casa.
Tudo se encaixava.
Retornando para casa disse ao marido que não havia nenhuma
carne. Ele apenas a observou atentamente. Seria aquilo
um teste? Teria sido reprovada? O jeito seria aguardar. O tempo
diria.
Mais tarde outra reunião foi convocada com todos os homens
da tabanka.
Segunda andava de um lado para o outro tentando disfarçar
o pavor que estava sentindo. Quando de repente algo aconteceu.
Entre as pessoas que andavam por ali, reconheceu um rosto
amigo. Era um balantas caçador que viveu um tempo em São
Vicente e a conhecia muito bem.
"Então, o que fazes aqui?" Segunda indagou ao seu amigo.
Estou há três anos em uma tabanka de balantas a alguns quilômetros
daqui. Sou caçador e estou à procura de alguns serviços.
"E você, que faz aqui?" lhe perguntou o caçador. Segunda revelou
que estava casada com um felupes há quase dois meses.
Segunda percebeu que o semblante de seu amigo mudara.
Ele se aproximou de seus ouvidos e lhe disse: "Vou te contar um
segredo. Este povo é canibal". Ela disse que já descobrira isso. "Então
vou lhe contar algo mais atemorizante. Na reunião desta tarde ficou
decidido que esta noite eles lhe matarão e comerão a sua carne".
Segunda ficou triste. Sabia desde então que dificilmente
conseguiria escapar dali, porém seu amigo lhe informou da existência
de um barco encalhado no Cacheu, aguardando a subida
da maré para retornar às águas que lhe permitirão navegar. O
amigo lhe disse:
- Eu virei até a sua casa e ficarei conversando com o povo.
Enquanto isso, discretamente, você amarre em minha bicicleta o
mínimo de carga que você tiver...
As águas deverão subir por volta das cinco horas da tarde.
Ao meu sinal você se oferece para me acompanhar na saída, e eu
te ajudarei a fugir.
O plano correu perfeitamente bem. Próximo das 17 horas
o balantas olhou pausadamente para Segunda e disse para o povo
da casa:
- Bom, tenho que ir. Já está ficando tarde. A moça imediatamente
disse:
- Eu lhe acompanharei até à saída. E ambos saíram caminhando
devagarzinho.
Na primeira curva da trilha os dois montaram a bicicleta e
pedalando rapidamente alcançaram o local onde o barco estava.
Dentro de segundos os balantas transpuseram o trapiche e se
jogaram dentro do barco. Em poucas palavras o caçador explicou
e rogou aos barqueiros que salvassem aquela mulher.
Eles a esconderam atrás de uma pilha de sacos de coco e
antes que o barco zarpasse, surgiu à margem do Cacheu cerca de
vinte ou trinta felupes, todos armados com lanças, arcos e flechas,
e instavam com o caçador, querendo a todo custo a mulher
que havia fugido. O balantas insistia com eles que ela havia voltado
desde a curva do caminho, e que estava ali apenas para
mandar um recado para alguém em São Vicente.
A insistência dos felupes foi tanta que dois deles adentraram
ao barco e se puseram a procurar por Segunda. Ao se proximarem
do local onde ela estava escondida, o capitão do barco lhes avisou...
Ali tinham sacos com ovos e se fossem quebrados eles
pagariam o prejuízo com a vida. Vários marinheiros surgiram e
eles saíram da embarcação.
O motor roncou. O barco ganhou o leito mais profundo do
Rio Cacheu e tomou rumo de São Vicente, sob uma chuva de
flechas. Os marinheiros fecharam as escotilhas e seguiram viagem
rio acima, chegando ao seu destino, na outra banda do
Cacheu, já tarde da noite.
Segunda desceu do barco. Assustada e transtornada com
tudo. Seguiu correndo estrada à fora, rumo ao vilarejo de
Antotinha.
Quando o Sol raiou, ela estava exausta, com sede e fome.
Escondeu-se no mato, ficando a espera de uma oportunidade para
escapar de uma vez dali. Foi quando afinal e providencialmente
eu passava por ali.
No caminho, eu vendo todo aquele desespero, a falta de
paz naquela alma, logo lhe apresentei Jesus Cristo, o Salvador.
Deus lhe abriu o entendimento e ela aceitou o Senhor como o
seu único e suficiente Salvador.
Vi rolar daqueles olhos outrora tristes, duas lágrimas de
gozo e de paz. Porque Jesus lhe havia perdoado todos os seus
pecados e lhe dado segurança e esperança.
Chegando a Bafatá reunimos os cooperadores da Igreja e
expus o acontecido. A nova irmã foi levada para ser hóspede de
uma mulher balantas que era cristã e membro da Igreja em Bafatá.
Ainda boquiaberto com tudo que havia ouvido, os irmãos
cooperadores disseram que apesar da proibição do Estado da
punição empregada, ainda existiam grupos isolados na selva que
praticavam o canibalismo.
O diácono Pedro, nosso cooperador, me disse:
- Irmão, eu sou natural de São Vicente. Já vivi em Apilho
e outras tabankas daquela região. Posso confirmar, inclusive, existem
casos que eu mesmo presenciei. Naquela região vivem além
de grupos balantas, os kassangas e mais dois tipos diferentes de
felupes. Os que são canibais e os que não são.
Convidei o irmão Pedro para pregar no culto da irmandade
no domingo, e dar testemunho de casos de sacrifícios humanos
seguidos de canibalismo, para sensibilizar a Igreja e despertar o
povo para combater, com a Palavra de Deus, essa barbárie.

FOTO : lugar de feitiçaria- consagrado a culto a demônios
 

05. ) AS ABOMINAÇÕES DOS GENTÍOS
.
Naquela manhã ensolarada, de domingo, o culto da irmandade começou com muita unção
do céu. O louvor cantado em várias línguas havia levado a igreja a um êxtase glorioso.
Duas pessoas caíram ao chão se rendendo totalmente ao Senhor Jesus. Outros dançavam
de gozo e poder do Espírito.
A igreja nascida no chão do povo muçulmano era composta quase cem por cento de
povos vindos do animismo. A maioria era balantas seguido dos papeis, manjacos,
mansoankas, bijagós e uma irmã fula. Várias nações que Deus, no seu amor, as
transformaram em uma só tribo, a do Senhor Jesus.
O irmão Pedro pregou naquele dia na língua creola. Baseado em II Crônicas 28: 3 –
“Também queimou incenso no vale do filho de Hinom, e queimou a seus filhos no fogo
conforme as abominações dos gentios...”.
Discorreu brilhantemente aplicando o texto à realidade africana. Testemunhou o que
Deus fez na vida da irmã Segunda. Desde o seu malfadado casamento até a fuga
providencial e posteriormente a sua salvação em Cristo.
E o povo jubilava, brados de aleluias e glórias a Deus ressoavam a todo o momento.
Pedro fora um “bakiadur” - um tipo de pastor de vacas – na sua infância. Vivia correndo
atrás de ídolos, tentando descobrir uma maneira de vir a herdar um grande “irã” – nome
dado a ídolos. Seu pai sentia até orgulho dele por causa disto. Vivia falando: “Um dia
ainda te levo na Kobiana”, lugar famoso naquela época pelos seus cultos aos “irãs”.
Certo dia o irmão Pedro fora ferido pelo estilhaço de uma mina e levado para Apilho nas
margens do Cacheu, para recuperar dos ferimentos em casa de um parente. Na época
da guerra as famílias viviam constantemente se mudando de região para se protegerem.
Apesar de ser advertido severamente pelo primo, de que não deveria de forma alguma
se relacionar com os vizinhos felupes, pois “eles são nhamidur di pekadur” (a expressão
creola quer dizer “comedor de pecadores”), dizia seu primo. Pekadur foi introduzida na
língua creola pelos padres portugueses que, na época da colônia, dizia a eles que todos
eram pecadores, não importando a tribo ou a cor.
O menino Pedro recuperou de seus ferimentos e voltou à lida de bakiadur. Apesar de já
saber que os felupes eram canibais, Pedro para vencer a grande solidão que sentia no
campo, arriscava, de vez em quando, amizades com bakiadores felupes. Durante as
longas horas do dia em que os pequenos pastores passavam juntos, seguindo o gado
das famílias, havia muitas trocas de conhecimentos e segredos culturais.
A afinidade entre meninos de raças diferentes foi se tornando cada dia mais estreita, a
ponto de muitas vezes Pedro se passar por menino felupes.
Os locais consagrados ao sacrifício e culto aos “irãs” felupes, estavam espalhados em
vários pontos da floresta. Estes locais eram muitos bem guardados por vigias para evitar
a penetração de intrusos.
Mas a curiosidade dos “bakiadores” era tamanha a ponto de espreitar dias a fio até
aproveitar um descuido do vigia, quando então penetravam no recinto para observar o
que de tão importante era guardado ali.
Pedro nos informou que além da tenda, confeccionada de tecido vermelho, para proteger
o “Irã”, havia vários objetos que eram usados na hora da cerimônia, mas o que mais  chamava a atenção eram os ossos da parte craniana de humanos que os sacerdotes
(feiticeiros) usavam para beber vinho como se fossem taças.
O “irã” pode ser qualquer coisa desde que consagrado para aquele fim. É confeccionado
com palha, pedra, madeira, chifre, carranca, etc. O importante é manter o máximo de
respeito por ele e ele possuir seu guardador que irá transferir a guarda em herança a um
parente que se mostra com vocação para aquele serviço.
Certo dia, movido pela curiosidade, eles foram chegando com seus rebanhos, devagar
como quem não quer nada, até às cercanias da casa grande onde residia o régulo felupes.
Observaram que a casa além de grande era construída longe do rio. No entanto, uma
grande vala, aberta manualmente, ligava o interior da casa real ao leito do rio.
Relatavam os meninos felupes de vez ou outra que havia um entra e sai suspeito de
canoas e que eles nunca haviam sabido do que se tratava. Alguns testemunharam que
garotos como eles que haviam entrado naquela casa uma vez, nunca mais foram vistos.
Mais tarde quando Pedro já estava adulto, ele soube que se um “irã” da tribo felupes
exigisse um sacrifício humano, e se a pessoa não tivesse nenhum estrangeiro ou intruso
aventureiro a quem pudesse lançar mão, era obrigado a oferecer um de seus próprios
filhos.
A vítima era levada à casa real. De lá saía de canoa para o altar e depois de imolado, ao
término da cerimônia, voltava de canoa em forma de carne para o banquete real. A gordura
que houvesse na carne era separada, defumada e reservada para o preparo de uma
iguaria feita à base de um tipo de peixe muito apreciado pelo régulo e seus grandes.
O fato marcante na vida do irmão Pedro foi que um de seus parentes balantas, após
ingerir certa quantidade de vinho, estando visivelmente embriagado, resolveu atravessar
a tabanka dos felupes até o outro lado a fim de visitar outros  balantas que residiam ali.
Ao retornar, um felupes escondido no mato o observava. De repente avançou para ferilo,
aproveitando-se de que o balantas estava cambaleante. Mesmo embriagado o balantas
lhe resistiu usando uma faca.
O felupes retrocedeu e fugiu, se pondo ao longe. Depois lançou mão de uma cana de
bambu com a ponta tipo bisel e perseguiu o balantas, transpassando-o com a lança
improvisada.
Depois arrastou o homem à beira do rio, lavou o corpo e sobre uma pedra o esquartejou.
Chamando outros felupes carregou toda aquela carne para um lugar mais seguro dentro
da floresta.
Os balantas preocupados com o sumiço de seu parente se reuniram em bando com mais
de cem pessoas entre homens e mulheres e começaram uma busca intensa. Passando
por todos os lugares que o balantas passaria, deram com o sangue derramado na clareira
onde o felupes o ferira.
Seguiram o rastro de sangue até a pedra onde havia sido realizado o esquartejamento
do homem. Não havia mais dúvida. O balantas estava morto. As buscas foram
intensificadas. Outros parentes ouvindo o que poderia ter acontecido formavam outros
grupos de busca.
Quando menos se esperava ouve-se gritos na floresta. O balantas fora encontrado.
Formou-se um corre-corre até o local de onde vinham os gritos. Chegando lá se depararam
com uma cena macabra. O infeliz jazia disposto a assar acima de um enorme braseiro
todo despedaçado e espetado em varas que eram girados de vez em quando. Um grupo,
de seis felupes, se revesava na tarefa. Um deles tinha na mão um pedaço de um dos
braços da vítima, que com voraz apetite devorava aquela carne “mal passada” e
sanguinolenta.
O bando de balantas revoltado com o que via, avançou sobre os felupes para prendê-los.
No entanto dois conseguiram fugir. Os outros quatros, amarrados, foram levados à sua
gente.
Ao balantas lhes impuseram uma condição. Que se não apresentassem de imediato os
dois fugitivos, a sua tabanka seria incendiada. Imediatamente os dois selvagens foram
apresentados.
Os prisioneiros se sentaram no chão formando um semicírculo, de modo que um podia
ver o outro. Perante representantes das duas tribos, receberam o castigo imposto pelos
balantas.
Diante de cada um foram colocados uma cuia cheia de sal e um pedaço do próprio corpo,
como uma orelha ou um dedo. Foi dito a eles que escolhessem entre o comer todo o sal
da cuia ou o pedaço de seu próprio corpo. Como seria impossível comer todo aquele sal,
foram obrigados a comer pedaços de seus próprios corpos.
Após o castigo os seis felupes foram amarrados e levados para Bissau, e entregues às
autoridades competentes.
Os antropófagos foram presos e posteriormente condenados por um crime tão bárbaro,
cuja prática é proibida não só no território guineense como em todo o mundo.
Com lágrimas nos olhos o irmão Pedro levou a igreja a um grande clamor por aquele
povo tão bárbaro e hostil. Fez um apelo fervoroso para que alguém de coragem se
levantasse e fosse viver entre aquela tribo e lhes pregasse Cristo.
 

06. ) OS DADOS SAGRADOS .

   Pv 16:33 Os homens jogam os dados sagrados para tirar a sorte, mas quem resolve mesmo é o Deus Eterno.
 
            Desde os primórdios de 1960 que houve tentativa de se invadir um “Reduto de Satanás” em uma cidade da Guiné Bissau na África Ocidental chamada Bafatá. O nome desta cidade traduz um significado curioso “Grande Iran”. Segundo alguns habitantes antigos daquela região pelo fato de lá ter vivido um famoso mouro “tipo de feiticeiro das raças fula e mandingas” que tinha seu nome conhecido até internacionalmente na época da Guiné Colônia. Devido  seus trabalhos de feitiçarias ser notáveis, pois ele era o único na Guiné que era herdeiro e possuidor do Grande Iran.
             A palavra Iran traduz satanás desde que um feiticeiro herda de seus antepassados uma peça que pode ser qualquer coisa desde um boneco de palha a uma escultura em madeira pedra ou outro material que tenha sido consagrada aos demônios e usada em cultos a esses espíritos, daí um demônio oportunista passa a acompanhar esta peça por onde quer que seja levada, pois ela lhe representa perante os humanos.
            Conta-se que dois casais de missionários originários da Inglaterra e Estados Unidos que em épocas diferentes chagaram a estar em Bafatá, um por uma semana e o outro por quinze dias com a finalidade de implantarem ali um trabalho cristão evangélico e que tão cedo deixaram não só a cidade como também o país, devido à grande depressão causada pela opressão demoníaca, e que jamais voltaram aquela terra.
             Foi por volta de 1964, que o Senhor Deus mostrou-me em uma visão a cidade de Bafatá e me disse que eu iria ser um missionário naquele lugar, não obstante a visão ser claríssima como eu não entendia nada de geografia, vezes ou outra sentia medo e como era um grande segredo para mim eu não tinha como perguntar a alguém.  Certo dia ouvindo eu um pregador em uma das nossas igrejas no interior de São Paulo der repente ele começou a falar em África foi então que senti aquele calafrio e achei que ele havia descoberto meu segredo e fiquei muito preocupado, no entanto ele se vira para meu lado e aponta em minha direção e cita: Isais 45-2  Eu irei adiante de ti, e endireitarei os caminhos tortos; quebrarei as portas de bronze e despedaçarei os ferrolhos de ferro. 
                   Isais 45-2  Norteou a minha vida e vinte anos mais tarde eu estava em fim seguindo para a África e experimentando na pratica as promessas de Deus. Fomos os primeiros missionários a entrar em Bafatá e pregar com ousadia a palavra de Deus, ver com nossos olhos as primeiras almas sendo salvas por Jesus, descendo as águas batismais contando seus primeiros louvores ao Criador de todas as coisas, testemunhando seu novo nascimento em Jesus e a grande libertação que haviam nele encontrado.
 
= = =
QUEBRANDO O CATIVEIRO
Certo dia após retornar da aldeia fula fiquei pensando na fidelidade de Deus. Ele havia
dito claramente quando eu ainda estava no Brasil. “Quebrarei as portas de bronze”. E
agora olhando para trás pude ver quantas portas o Senhor já havia quebrado.
Lembrei-me do primeiro dia em que coloquei os pés no chão bafatense. Havia ido até lá
acompanhado de alguns irmãos guineenses que residiam na capital. Levamos conosco
panfletos com porções bíblicas e mensagens nos dialetos papel, balanta, fula e mandinga.
Nosso objetivo era apenas “espiar a terra”.
Alguns colegas brancos já haviam tentado nos desencorajarmos. Um disse: “Bafatá é
uma cidade completamente dominada pela feitiçaria. Só em chegar lá se sente a grande
opressão”. Outro dizia: “Já houve tentativa de implantar a igreja naquela região por duas
vezes, porém sem sucesso algum. Dois casais enviados para lá e em menos de quinze
dias fugiram amedrontados”.
“O primeiro casal, com um filho de doze anos, vindo da América do Norte, foi morar em
Bafatá. Certa noite o homem se levantou para ir até a cozinha. No meio do corredor ele
se deparou com uma barreira invisível que o impedia de passar. Tremendo de medo
voltou e foi ao quarto do filho. O chamou e sem lhe contar nada, pediu para que ele fosse
até a cozinha. O menino seguiu pelo corredor e se deparou, também, com o mesmo
problema. No outro dia fora para Bissau, compraram passagem para os Estados Unidos
e nunca mais voltaram ali. O outro casal que foi tentar ali a implantação da igreja, a
mulher foi tomada de grande tristeza e somente sentia alívio quando saia dos limites
daquela cidade. Este casal também se foi para não mais retornar”.
Um terceiro irmão me disse que a palavra Bafatá significa Grande Inã e que notáveis
bruxarias eram praticadas ali tanto pelos “djambcoses” feiticeiros dos animistas como
pelos “mouros” feiticeiros dos muçulmanos. Bem, ali estávamos com uma bolsa cheia de
panfletos e o coração transbordando de desejos de colher muitos “frutos” naquela terra.
Aproveitando o movimento de pessoas na feira, arrisquei um discurso improvisado
tentando explicar o motivo de nossa visita. Falei em português enquanto os irmãos
traduziam para a língua creola e para o dialeto balanta.
Começamos então a distribuição da literatura. Fiquei espantado ao ver o grande interesse
do povo pelos folhetos. Alguns tentavam pegar das mãos de outros. A maioria deles
quando conseguia apanhar algum panfleto, colocava sob a camisa e corria para longe
onde com carinho desamassava o papel e punha-se a ler cuidadosamente.
Foram distribuídos milhares de folhetos naquele dia. Eu confesso que não acreditava
muito no que acabara de ver. Achei que todo aquele interesse seria apenas pelo fato de
ter sido distribuído gratuitamente, pois o país vivia praticamente de doações. E aquilo
era mais uma doação, pensava eu.
Só dois anos mais tarde a igreja já era uma realidade viva em Bafatá. Os jovens
estavam testemunhando como eles haviam encontrado com Cristo e porque se
consideravam salvos. Pelo menos três deles fizeram alusão àquele dia da entrega
dos folhetos. Um deles foi ainda mais específico e disse que naquele dia ele me
viu falando na feira e pensou consigo mesmo: se este branco deixou a sua terra
cheia de conforto e coisas bonitas e veio para este ermo do mundo, é porque este
Jesus que ele fala é verdadeiro. E naquele mesmo dia ele se converteu a Cristo.
Quando ouvi isto, chorei e pedi perdão a Deus pela minha incredulidade.
Após a entrega da literatura naquele primeiro dia, voltamos a capital. Passamos a
traçar planos para invadir o reduto dos famosos feiticeiros e seus inãs
amedrontadores, e libertar aquele povo da escuridão em que vivia.
Deus falou-nos muito naquela época em Provérbios 24:11. “Livra os que estão
destinados à morte, e os que são levados para a matança se os puderes retirar”.
Voltamos a Bafatá e alugamos uma casa. Ela era feita de lama e coberta com
chapas de zinco. Com permissão do senhorio iniciamos uma pequena reforma e
adaptações para torná-la mais habitável.
Durante o tempo em que durou a reforma eu vinha de Bissau todas as semanas
com três rapazes crentes para ajudar no trabalho da casa. Eu mesmo cozinhava
para nós, pois ali não havia restaurante devido a crise que o país enfrentava no
pós-guerra. Existiam vários prédios com fachadas escritas restaurante ou caso
de pasto, mostrando certas regalias do tempo da Guiné Portuguesa.
Um dia desci à feira para comprar peixes e tomates para o almoço. Passando por certa
rua vi um desses restaurantes com as portas abertas, várias mesas com toalhas brancas
e um movimento de rapazes na calçada defronte ao restaurante.
Não perguntei nada a ninguém, nem comprei os peixes. Voltei imediatamente para a
casa e disse aos irmãos: tomem banho, mudem de roupas, pois hoje vamos comer no
restaurante.
Eles ficaram um pouco assustados, porém acreditaram em mim. Tudo pronto partimos
então para almoçar fora. Quando paramos o carro perto do restaurante e começamos
a caminhar naquela direção, notamos um certo alvoroço entre os rapazes que ali se
encontravam. Um entrou rapidamente voltando logo depois acompanhado de um
senhor que falando português veio nos receber.
Eu disse-lhe: queremos almoçar. Ele: pois não. Nos conduziu a uma mesa que pelo
aspecto parecia ser a principal. Tomamos nossos lugares. Imediatamente todos os
rapazes também ocuparam os demais lugares em outras mesas e o almoço foi servido.
Tivemos peixe com caldo de mancarra, uma comida africana muito apreciada. Mancarra
se traduz por amendoim da língua portuguesa arcaica e é usada na língua creola. O
cozinheiro usa um peixe, de boa espécie, cortado em postas, tempera a gosto e leva
ao fogo para cozinhar com água cobrindo as postas. Quando está quase cozido
acrescenta o amendoim torrado e moído feito pasta que transforma a água em um
caldo grosso também temperado com suco de limão. É servido com arroz branco.
O almoço estava realmente muito bom, mas quase no final um dos irmãos sem querer
ouviu a conversa na outra mesa e me disse:
- Estes rapazes são do time de futebol da cidade e eles estão te confundindo com um
treinador português que está vindo de Lisboa para dar uma palestra para eles.
- Bom, agora é tarde para voltar atrás. Tivemos a sorte de chegarmos antes do
português.
Dirigi-me ao balcão, pedi para pagar as quatro refeições. O senhor andou de um lado
para outro, fez alguns cálculos e finalmente conseguimos pagar e voltar para casa. No
caminho os irmãos me disseram que os restaurantes somente funcionam sob encomenda!
Terminada a reforma mudamos para Bafatá. Foi muito difícil no início, mas todos os dias
saíamos para levar a Palavra. “Salmos 126:6 – Aquele que levar a preciosa semente,
andando e chorando, voltará sem dúvida com alegria, trazendo consigo os seus molhos”.
A igreja começou a crescer. Cada dia sempre tínhamos novas pessoas assistindo as
reuniões. Começamos em uma sala pequena. À noite era quase impossível estar ali
devido a quantidade de ratos famintos que o tempo todo subiam e desciam nas paredes.
Usávamos lamparinas de querosene para estudar a Palavra.
Mudamos então para um segundo salão onde era mais arejado e tinha iluminação elétrica
fornecida por um gerador. A maioria dos membros era de rapazes. Cinco para cada
menina e dez jovens para cada adulto. O grupo de crianças era enorme. Tínhamos crentes
oriundos de várias tribos diferentes, porém a raça balanta era predominante.
O evangelismo nas tardes de domingo sempre dava resultado positivo. Saíamos em
grupo de cinco pessoas. Um grupo para cada lugar. Quase sempre retornávamos trazendo
novos ouvintes para o culto da noite.
Foi observado pelos jovens no bairro onde estava o salão da igreja que não estava
acontecendo conversões e o povo dali recebia os irmãos com certa frieza. Alguns
prometiam ir às reuniões e nunca iam.
O irmão Jamanka, um crente fervoroso e dedicado, gastava muito tempo em oração e
nunca perdia os cultos. Alegou a culpa a uma senhora conhecida como Nhá Aima. Esta
mulher era uma feiticeira muito respeitada pelas suas bruxarias, herdeira de certos irãs
temidos pelo povo.
Resolvemos então colocar à senhora Aima como alvo a ser alcançado. A igreja dobrou o
joelho e orou. Um dia fomos em grupo visitá-la. O resto do povo ficou orando. Falamos de
Jesus a ela com tradução para a língua balanta. Esta mulher aceitou Jesus, se prostou
perante o Rei, pediu perdão de seus pecados prometendo jamais se envolver em feitiçarias.
Destruiu muitas coisas relacionadas com o culto aos irãs. Passou a freqüentar a igreja.
Cantava e orava. Participava de tudo na vida da igreja. Os irmãos todos estavam contentes
com a transformação de Nhá Aima.
Três meses depois a irmã Aima caiu doente. Apesar das constantes visitas e orações ela
ia cada vez mais definhando. Se bem que ela era bastante velhinha. Uma vez pergunteilhe
em que ano havia nascido. Ela me disse: “Foi quando a terra tremeu a noite, as aves
voaram das árvores no escuro e o djambacós diouf saiu da casa gritando, figa canhota,
figa canhota”.
Não entendi nada, mas os irmãos que estavam comigo fizeram mais algumas perguntas
em balanta e me informaram que ela estava perto dos setenta anos. E que o povo mais
antigo não tinha por costume marcar o número do ano em que nascera e sim aludir ao
acontecimento mais importante daquele ano.
Os dias foram se passando e a irmã Aima cada dia mais fraca e doente. Estávamos até
esperando que Deus a levaria a qualquer momento.
Num domingo, final de culto, eu estava pregando e quando no encerramento vi quando
alguém chegou à porta do salão falou qualquer coisa com o diácono e este imediatamente
veio até onde eu estava e me disse no ouvido: “A irmã Aima mandou avisar que vai fazer
um sacrifício para o Irã. A família dela está toda reunida em sua casa. Ela quer ver o
irmão antes de fazer o sacrifício”.
Deixei alguém encerrando a reunião e com mais cinco irmãos fomos correndo para a
casa da irmã Aima. Ao chegar deparamos com a irmã deitada numa esteira. Sobre a
mesa uma lamparina fumegava ao lado de um garrafão de vinho de cana tampado com
um pedaço de sabugo. Ao pé da mesa estava um bode, branco, amarrado e toda a sua
família reunida à sua volta.
Quando vi tudo aquilo fiquei realmente admirado. Ela explicou que devido a sua doença
um de seus filhos havia consultado um djambacós conhecido e ele aconselhara a continuar
na nova religião em que estava agora, porém deveria fazer aquele último sacrifício para
ficar livre das obrigações com os irãs.
Eu disse-lhe:
- Isto é uma cilada. Se você sacrificar agora, estará perdida para sempre. O que está
acontecendo aqui é uma luta entre as trevas e a luz. Se você ficar com Jesus, Ele
honrará sua fé e você será abençoada, mas se sacrificar estará negando Cristo, caindo
da fé e voltando à escravidão.
Como o filho de Aima não me deixava falar, pois falava junto o tempo todo, enquanto eu
aconselhava a entrar pelo caminho certo, ele dizia:
- A senhora tem que sacrificar. Esta religião de branco só atrapalhou sua vida.
Eu sugeri que enquanto nós orávamos ela decidiria. Assim que terminássemos a oração
ela diria o caminho que havia escolhido.
Oramos pedindo a Jesus que curasse aquela vida e mostrasse a todos os incrédulos que
Ele era o Senhor para honra e glória do seu próprio nome.
De repente ouviu-se um grito. A irmã Aima levantou-se do chão rapidamente como se
fosse uma menina de dezoito anos. Começou a gritar: “Jesus me curou, Jesus me curou”.
Pegou o garrafão de cachaça e jogou no terreiro. Ela mesma desamarrou o bode e chutoulhe
o traseiro. O bicho sem entender nada fugiu rápido pela escuridão a fora.
A igreja havia chegado em peso ali. A irmã Aima dizia em alta voz:
- A culpa é minha. Quando eu decidi ser crente joguei apenas as coisas mais simples
que eu usava na feitiçaria. As mais importantes eu ainda as tenho comigo. Quero na
presença de todos me despojar de tudo o que está escondido e ficar somente com
Cristo.
Autorizou os irmãos que entrasse em seu quarto e debaixo da cama apanhassem os
objetos escondidos e os trouxessem para o terreiro para serem queimados. Muitas coisas
foram encontradas.
Dizia ainda: “Na casa de Juliano há mais objetos”. Os irmãos iam lá e voltavam carregados.
“Agora na casa de Boná”. Os irmãos iam buscar e traziam. “Na casa de Lamine está o Irã
tal”. Imediatamente alguém se dirigia até lá e trazia.
A fogueira ficou enorme com irãs feitos de pau, palha, patuás, amuletos, as panelas de
barro para a comida sagrada foram quebradas com mó de pilão.
A igreja aproveitou a ocasião para cantar na língua creola o coro que diz:
“Di katiberasko, Jesus libertam, di katiberasko Jesus libertam”. Do cativeiro Jesus libertoume,
do cativeiro Jesus libertou-me.
Aquela mulher realmente foi muito abençoada por Deus. Desceu a um banhado nas
margens do Rio Geba. Preparou a terra e plantou muitas hortaliças. Levantava às 5
horas da manhã. Todos os dias ia aguar sua horta . Depois colhia uma cesta enorme e
levava à feira onde vendia tudo. Todo o dia ia ao culto e levava o dízimo diário de tudo
que arrecadava.
Mandou vir do Senegal chapas de zinco. Os pedreiros retiraram a cobertura de palha de
sua casa. Ergueram as paredes e cobriram com o zinco. E todos os dias Deus tinha uma
benção para ela. E a igreja vibrava no poder de Deus.

 

07. ) PLANTAÇÃO DE IGREJA BAFATÁ- G.BISSAU

PLANTAÇÃO DE IGREJA, TRABALHO EVANGELISTICO PIONEIRO EM BAFATÁ- GUINÉ BISSAU- DECADA DE 80- MISSIONÁRIO JOSÉ FERREIRA
.

Fotos :  
Kalifa 
Minha filha marcia com a filha de Kalifa de nome Marcia 
Tabanka de balantas ponto de pregação
Tabanka fula da Kalifa




08. ) A IGREJA EVANGELICA DE BAFATÁ CONVIDA O MISSIONÁRIO JOSÉ FERREIRA PARA O “ENCONTRO DE MISSIONÁRIOS, AMIGOS E CONVERTIDOS DA IGREJA EVANGELICA DE BAFATÁ” _ 01/03/2010





09. ) O Grande desafio

03/03/2010 
 O GRANDE DESAFIO
A jovem igreja em Bafatá tinha atividades constantes. Quase que todos os dias da semana eram realizadas reuniões.
O domingo era todo consagrado ao Senhor. Às 5 horas da manhã iniciava a reunião de oração, seguido da Escola Dominical. Depois vinha o culto da irmandade e daí uma pausa para o almoço. À tarde, culto dos jovens seguido de evangelismo pessoal. À noite, era realizado o culto público.
Eram tão boas a comunhão da igreja com o Senhor naqueles cultos aos domingos, que durante a semana antegozávamos as surpresas que Ele nos daria.
Os irmãos que não podiam freqüentar as reuniões durante a semana pela distância em que se encontravam no domingo, por nada desta vida perdiam as reuniões. Alguns chegavam a caminhar 25 quilômetros, vindo de madrugada e após o culto da noite, seguiam seu caminho andando mais 25 quilômetros de volta à sua casa.
Um grupo de balantas que vivia a vários quilômetros de Bafatá, ao todo cerca de vinte e cinco almas, aos domingos se revezava para assistir aos cultos em Bafatá. E a cada quinze dias íamos um grupo de irmãos lá na tabanka deles. Eles mesmos haviam construído uma capela cercada de bambu e coberta com folhas de palmeiras.
Durante o dia as cabras descansavam naquela boa sombra fugindo do Sol nas horas mais quentes. À noite retirávamos o estrume deixado pelos animais e o povo entrava cada um com seu próprio banquinho trazido de casa, para louvar e cultuar a Deus.
Ao longo da tabanka balantas havia outra, porém do povo fulas, bem maior que a primeira, com cerca de duzentos e cinqüenta a trezentos habitantes. Mas como os fulas são povos muçulmanos, as nossas tentativas de evangelizá-los quase sempre se frustravam porque é quase impossível que um muçulmano deixe sua fé. Ainda que ele venha a cogitar isto em pensamento, muitas vezes nem o evangelizador fica sabendo se houve ou não a possibilidade dele se tornar um cristão evangélico. Eles temem ser pegos ou descobertos mudando de fé. Com certeza seriam castigados pelos parentes. O mínimo que poderia acontecer a eles é a expulsão do meio da família e da comunidade, daí vai até a perseguição e morte.
Como para Deus tudo é possível, vez ou outra íamos a tabanka fulas e falávamos de Jesus. Tínhamos que usar um intérprete, pois a maioria das mulheres não fala a língua creola.
Acontece que um homem de nome Braiam, chefe daquela aldeia, casado com duas esposas, sendo que a primeira lhe havia dado vários filhos, porém a segunda esposa com a qual estava casado há oito anos, não podia ter filhos. Na cultura africana principalmente na raça fula, uma mulher estéril possui um problema
realmente sério. Ela é totalmente desconsiderada quando não, devolvida à casa do pai sob uma saraivada de insultos. Pode simplesmente ser expulsa, não lhe restando outra alternativa a não ser o trabalho de “comadre”. Naquela região da África o termo
comadre identifica uma prostituta.
Homem que não tem condições de ter várias esposas aluga estas comadres por um certo período de tempo. Visto que uma africana após se sentir grávida não pratica mais relações sexuais até que a criança desmame. Isto pode levar entre três a quatro anos. É neste intervalo que a comadre fica morando na casa com a finalidade de
prestar seus serviços ao homem. Deve ser bem tratada pelas esposas. Ter comida feita e roupa lavada. No fim do contrato elas partem em busca de novo emprego. Já o homem fula, se for constatada que a esterilidade é da parte dele, resolve-se da seguinte maneira: o marido estéril procura um “benfeitor”, homem amigo que fará o favor de engravidar sua esposa e depois desaparece de cena. O filho fica para o marido. Este assunto é estritamente sigiloso. Quanto menos pessoas se envolverem
melhor. O ideal é que apenas três pessoas conheçam o segredo.
Mas no caso de Braiam ele amava muito Khalifa, sua segunda esposa. Vivia alimentando esperanças de que um dia ela se curaria daquela esterilidade e lhe daria muitos filhos. No entanto oito anos se passaram e a solução parecia nunca chegar.
Certo dia Braiam, o fula muçulmano, me convidou para uma conversa em sua casa. Fui com meu amigo balanta para saber o que ele tinha para nos falar. Fomos levados a um  salão separado das casas. Vários homens estavam ali reunidos, sentados sobre as pernas cruzadas, formando um círculo.
Braiam retirou de uma pequena sacola que ele carregava amarrada à cintura, uma semente de cola que partida em vários pedacinhos foi servida aos convidados. A cola, muito usada naquela região, é uma semente com cerca de seis centímetros de diâmetro e
extremamente amarga. Uma vez ingerida desaparece a sensação de fome, segundo eles. Quando comi o pedaço que me foi servido senti como a minha língua fosse encolhendo, o esôfago se estreitasse e o estômago ficasse pequeno.
Em seguida ele me disse:
- Quero lhe fazer uma proposta. Se este Jesus que você prega abençoar Khalifa para que ela possa engravidar. Eu dou toda a liberdade para ela seguir a religião de vocês.
- Tudo bem, disse-lhe. Jesus pode. Nós vamos orar e Ele vai fazer esta obra na vida de Khalifa.
Quando saímos dali foi que eu pensei seriamente naquela proposta. De fato Jesus tem todo poder, mas e a nossa fé? Agora o grande desafio estava lançado. Temos que seguir em frente e crer somente. A igreja colocava a vida de Khalifa diante do trono de Deus
 
constantemente em oração.
Três meses se passaram. Uma certa tarde recebio a visita de um mensageiro. Um garoto apresentando doze anos chegou em nossa casa, correndo desde a aldeia dos fulas, com a mensagem de que Braiam havia abatido um porco do mato para nós e que devíamos ir
busca-lo imediatamente, pois ele também queria me ver.
Era comum alguém nos avisar que havia abatido algum animal e que devíamos buscar. A caça é abundante. Uma manada de porcos conta com cerca de trezentos a quatrocentos exemplares. Pode numa só noite acabar com a lavoura de alguém. As pessoas que têm lavouras precisam montar guarda durante toda a noite para evitar o desastre. Os nativos possuem espingardas de caça, porém é muito difícil conseguir munição. Nós éramos proibidos de ter armas de fogo, no entanto podíamos comprar munições no Senegal.
Então fazíamos o seguinte acordo, entregávamos nas mãos de um homem da roça uma caixa de cartuchos e ficávamos com a metade das caças abatidas. No caso dos muçulmanos que não comem carne de porco, eles caçavam gazelas para si e porcos para nós.
Pois bem, peguei a moto e com o rapazinho na garupa fui até a casa de Braiam. Lá estava ele tentando chamuscar o porco com palha que ele retirava da cobertura das casas. Depois de limpar o animal e retirar-lhes as vísceras, colocamos em um saco
plástico e depois em um outro de estopa, que foi bem amarrado na garupa da moto.
Então Braiam olhou para mim e começou a dizer:
- Alah djarama, Alah djarama. Pode levar a Khalifa. Eu não entendi nada. Muito
assustado, disse-lhe:
- Espera, vou buscar meu amigo para entender o que está acontecendo.
E fui correndo à casa do balanta e assim que eu o vi fui falando:
- O Braiam está muito esquisito, falando um pouco na língua fula e um pouco na creola. Parece que ele largou da mulher e agora quer que eu a leve embora dali.
O irmão muito assustado saiu correndo e eu também até chegarmos onde Braiam nos esperava.
Como o irmão balanta morava muito tempo vizinho do povo fula, sabia falar um pouco daquela língua. Foi chegando e falando com Braiam que em poucas palavras explicou tudo. Os dois, sorrindo muito, olharam para mim que me mantinha sério. O irmão me
disse:
- Alah djarama quer dizer obrigado Deus. Ele está dizendo que Khalifa está grávida e que de agora em diante podemos levar ela para os cultos, pois ela agora é crente como nós.
Então eu repeti: Alá djarama. Eles começaram a repetir e de repente havia mais de trinta pessoas à nossa volta, todas gritando Alah djarama... Alah djarama. Daí em diante não vi a hora de relatar para a igreja, que ao ouvir jubilaram de gozo pela fidelidade de Deus. Toda honra e glória ao Senhor Jesus.
A irmã Khalifa jamais deixou de freqüentar as reuniões todos os domingos e mesmo grávida caminhava vários quilômetros para assistir todas as reuniões e durante a semanaela se reunia com os vizinhos balantas.
Deus providenciou uma irmã que falava muito bem a língua fula, para estar sempre ao lado de Khalifa, traduzindo todas as mensagens e até as letras dos cânticos.
Certo dia aconteceu algo que há muito esperávamos. O casamento de Segunda. Ela namorava um jovem membro da igreja em Bafatá. Os dois haviam sido batizados nas águas recentemente.
O batismo foi realizado no Rio Geba. Cerca de quarenta candidatos desceram as águas naquele dia. O Rio Geba passa quase dentro de Bafatá, com cerca de cento e cinqüenta metros de largura, mais adiante recebe o Rio Corubal, seu tributário, formando assim um
grande rio e logo deságua no Oceano Atlântico.
Os noivos iriam se casar no cartório conforme a lei e depois na igreja. A noiva estava eufórica, pois até seu vestido de noiva ela já tinha.
Um grande bolo fora encomendado. Almoço e janta para todos os convidados. Enfim o grande dia havia chegado. Toda a igreja veio para o casamento e a festa, inclusive Khalifa já com quarenta semanas de gestação.
Khalifa assistiu o casamento no cartório pela manhã. Almoçou mas não assistiu a cerimônia na igreja, pois no intervalo ela deu à luz a uma menina bonita e saudável, que nasceu em nossas mãos. Levamos depois para o hospital para os devidos cuidados. A criança recebeu o nome de Márcia em homenagem à nossa filha mais velha. Khalifa e Márcia ficaram conosco cerca de vinte dias. Depois as levamos para a sua casa, onde foram recebidas com festas.
Na tabanka de Khalifa, tivemos toda a liberdade para entrar e sair a qualquer hora, para fotografar o povo no seu dia a dia, para conversar com qualquer pessoa. Quando chegávamos lá o povo dançava de alegria. Era muito interessante a recepção que eles nos davam.
Toda honra e toda a glória ao nosso amado Jesus
 

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